quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Hoje podia pintar-me de castanho acinzentado. Podia ir para o meu meio e fazer confundir as minhas mãos com um tronco de um carvalho. Seria de novo invisível para todos os outros, qual criatura escondida dentro de uma toca ou num ninho feito num tronco de árvore.
            Desejo ardentemente livrar-me daquilo que em mim é amarelo vivo e verde garrido. Quero livrar-me do bicho venenoso que aqui habita. Quero voltar a ser aquele bicho camuflado que era no momento em que nasci, voltar a ser castanha e cinzenta, ou verde escura como as folhas das árvores.
            Quando nasci, escapava facilmente aos predadores. Sempre que eles se aproximavam, encostava-me calmamente ao meu carvalho-porto-de-abrigo e nenhum me tocava. Era livre.
            Houve, porém, um dia em que fiz nascer em mim a minha primeira pinta amarela. Julgava que seria ainda mais livre ao fazê-lo. Então, continuei a fazer surgir em mim mais pintas, todas amarelas e verdes. Continuava a pensar que era cada vez mais livre.
             Até que um predador me viu! Tive de correr, escavar, trepar para escapar. Era tão visível como uma salamandra de fogo! Havia sido enganada pelo meu próprio orgulho! Não me tinha libertado, tinha-me antes amarrado a mim própria e já não me conseguia soltar!
             Hoje, estou aqui, a sonhar com castanhos e cinzentos. Quero libertar-me de mim mesma e voltar a encontrar o meu carvalho predileto, onde me sentia protegida. Ele também me quer proteger. Não consegue porque eu fugi do seu abrigo ao fazer surgir em mim estes amarelos.
             Resta-me ficar aqui, enquanto outro predador não me encontra, a desejar esconder as minhas pintas com castanho acinzentado.
Vera Prazeres, 12ºC

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