sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Branco Mármore


Acordas. Abres os olhos. E não sabes onde estás. Respiras fundo, gritas com todo o ar que tens nos pulmões: “Está aí alguém?”. E não ouves nada. Vais até à porta. Desatas aos murros. Berras. Gritas. Numa combinação perfeita entre loucura e medo. “Onde é que eu estou?”. E então ouves passos vindos do outro lado do pequeno quarto branco com apenas uma porta de metal. Ouves os passos cada vez mais perto. Sentes um respirar do outro lado da porta e um grito perfura-te os tímpanos: “Está ai alguém?”. E, no instante a seguir, batem-te à porta num desespero horrível: “Onde é que eu estou?”.
Procuras pelo quarto qualquer coisa para abrir a porta mas nada encontras. Reparas na fechadura. É diferente de todas as outras. Tem apenas um círculo que liga um lado ao outro da porta. Não tem ranhura. Então, tu espreitas e vês um olho. Assustado, cambaleias e bates contra a parede. Levantas-te meio tonto e vais de novo à porta. Rodas a maçaneta. Esta parte-se. Tentas abrir a porta, mas sentes algo a puxá-la. Olhas pelo buraco e vês de novo o olho e gritam os dois numa perfeita sinfonia: “Deixa-me abrir a porta!”. Ficas a tentar arrombar a porta por algum tempo e, então, deixas-te cair contra o chão duro de mármore branco e frio como a neve. Embates com as costas no chão e choras num pranto enorme. Adormeces então num sono profundo. Acordas de um sonho mau e apercebes-te de que, do maior pesadelo, ainda não acordaste.
Vais até à porta. Olhas pela fechadura e vês um corpo deitado no canto, imóvel, num sereno e sossegado sono. Abres a porta e tentas passar para o outro lado. O corpo deitado no canto acorda. É um homem tal como tu. Duas pernas, dois braços, um nariz, uma boca, dois olhos e uma cicatriz. Uma cicatriz igual à tua. Mesmo acima do olho, no meio da sobrancelha. E então pensas para ti mesmo: “Será meu irmão?”; mas, no momento a seguir, apercebes-te que não, pois ele começa a portar-se como um animal. Começa aos murros. Aos pontapés. E tu tentas desviar-te e defender-te em simultâneo. Mas são ambos demasiado fortes. Então, tu tentas correr para o quarto branco de novo mas ele agarra-te um pé. Tu cais e ficas a meio da porta. Ele morde-te a perna e tu gritas ao sentir os dentes a arrancar um pedaço de carne. Dás o maior pontapé que consegues, acertando-lhe no peito e fazendo-o cambalear. Consegues chegar à maçaneta que outrora se tinha partido e, mesmo no momento em que ele se atira para te atacar, tu dás-lhe com a maçaneta de metal na cabeça, fazendo-o perder os sentidos. E é então que de tanto ser forte, procurou a paz com as próprias mãos. Voltas a fechar a porta. E adormeces. Num canto. Com as mãos cobertas do precioso líquido da vida.


Valter Ferreira

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